CARACTERÍSTICAS PARTICULARES DA CIVILIZAÇÃO JAPONESA

Tenho muito a dizer sobre as características peculiares do Japão e do seu povo. Se os japoneses tivessem profunda compreensão a esse respeito, jamais precisariam ter experimentado o amargo destino de povo vencido na guerra, nem ter visto seu país em ruínas. Existe uma expressão que nos aconselha a conhecermos bem a nós mesmos, mas é necessário estender esse pensamento aos limites do conhecimento de nossa pátria. Na época do isolacionismo (séc. XVII – séc. XIX), ainda seria admissível os japoneses desconhecerem seu próprio país; atualmente, porém, quando tudo se processa em âmbito mundial e internacional, é de vital importância conhecermos profundamente o país em que nascemos. Em termos de Japão, esse conhecimento consiste em estarmos perfeitamente cientes da missão que ele deve cumprir.

É evidente que, se não compreendermos o motivo da existência do Japão, não poderão ser consolidadas as grandiosas metas nacionais. Para melhor entendimento, basta lembrar a situação do país até o fim da Segunda Guerra Mundial. Havia uma classe militar dominante, chamada Gumbatsu, que era detentora de poderes absolutos. Escolhida por um pequeno número de pessoas, governava o país como bem entendia. Por isso, no que se relacionava aos governantes, o povo não tinha direito ao uso da palavra, acomodando-se à condição de serviçais. Esta situação ainda está bem gravada em nossas mentes. A partir da Era Meiji (1868-1911), instituiu-se a Constituição e foi criado o Sistema Representativo. Com isso, embora desse a impressão de que se estavam respeitando as ideias do povo, na verdade a política encontrava-se nas mãos de uma minoria, que acabou por fazer aquela terrível guerra. Foi a mesma coisa que vender gato por lebre.

Vamos refletir sobre a história do Japão. Desde a remota época do imperador Jinmu, este país não teve um período sequer de paz, sendo contínuas as guerras internas. A política sempre esteve totalmente dominada pelo regime de força. Disfarçados sob o belo nome “Código de Ética do Samurai”, bárbaros assassinos recebiam condecorações heroicas. O vencedor das guerras assumia a hegemonia desse tempo.

Até o fim da Segunda Guerra Mundial o Japão veio sendo arrastado sob esse regime de brutalidade, só interrompido após o grande choque da derrota. Se os japoneses não se conscientizarem profundamente do significado de tudo isso, será impossível surgir uma verdadeira política nacional, digna de uma nação pacífica. Para tanto, o mais importante é uma nova conscientização do país. Em verdade, o Japão deveria ser o oposto da nação violenta e despótica a que costumamos nos referir; assim, é preciso que ele se torne uma nação pacífica e artística. Esta é a missão que Deus lhe concedeu.

Fala-se muito sobre a reconstrução do país, mas isso por si só não tem grande significação. Se analisarmos com imparcialidade, veremos que não passamos de uma nação democrática sem preparo bélico, o que, naturalmente, constitui motivo de alegria. Entretanto, o Japão precisa compreender sua missão peculiar em relação ao mundo e empenhar-se pelo bem-estar de todos os povos: eis o verdadeiro papel do Novo Japão. Vou enumerar algumas das razões que me levam a fazer essa afirmativa.

Em primeiro lugar, as maravilhosas paisagens da terra japonesa. No mundo, talvez não haja outras que se lhe comparem; estamos sempre ouvindo elogios por parte daqueles que nos visitam.

No que se refere ao tempo, as estações do ano são bem definidas, o que é muito significativo. Há uma contínua renovação dos aspectos da Natureza: as montanhas, os rios, a grama, as árvores, etc. Isso está bem claro nas palavras do famoso poeta Kyoshi Takahama, que, após ter viajado pelo mundo inteiro, disse o seguinte: ” Não existe país onde as estações sejam tão bem definidas como no Japão. O haikai* canta as estações do ano, de modo que, em outros países, não é possível compor um haikai autêntico “. Além disso, ouve-se dizer que a nossa riqueza em variedade de grama, árvores, flores, folhas, frutos e produtos do mar é realmente incomparável.

Outra característica marcante do povo japonês é a habilidade manual, o que justifica o seu pendor artístico. A prova disso é o número elevado de magníficas obras de arte criadas no Japão, não obstante o seu passado de constantes guerras internas. Ainda hoje nos surpreendemos com essa técnica e dom admiráveis.

Com tudo que foi explicado, creio que se pode entender a missão do Japão e do seu povo. Em resumo, é preciso transformar todo o território japonês no Jardim do Mundo e empreender contínuos esforços no sentido de promover a Arte, até que ela atinja o seu mais elevado nível. Ou melhor, deve-se estabelecer uma política nacional baseada no turismo, na Arte e no artesanato, empregando todo o empenho na sua concretização. Como resultado, é natural que isso contribuirá para a elevação do pensamento de toda a humanidade, proporcionando, também, um nível mais alto de recreação e distração. Em poucas palavras, é importante fazer do Japão um país de elevadíssimo nível artístico e cultural.

Podemos afirmar que nunca se temeu tanto a guerra e se desejou tão ardentemente a paz como na época atual. A causa da guerra, como sempre dizemos, é substituir nos homens uma forte disposição para a luta. Logicamente, essa disposição tem origem no pensamento selvagem, o que significa dizer que, embora os homens se considerem civilizados, na realidade ainda lhes falta muito para se despojarem da selvageria. O meio para solucionar o problema é fazer com que a humanidade mude o objetivo pelo qual está vivendo. A meta dessa mudança deve ser a Arte, isto é, deve-se transformar o mundo infernal, repleto de lutas, num mundo paradisíaco, repleto de Arte. Através da ameaça armada, podemos obter uma paz momentânea, mas a paz duradoura só poderá ser conseguida pela renovação do pensamento. Essa renovação, eu afirmo, só se efetivará por meio da Religião e da Arte.

Não falemos, portanto, em reconstrução do Japão, e sim na construção de um Novo Japão. Para que isso possa se tornar realidade, só há um meio: transformá-lo numa nação artística.

1º de janeiro de 1950