ENTREVISTA DE MEISHU-SAMA COM O DR. TETSUZO TANIKAWA, DIRETOR DO DEPARTAMENTO DE LETRAS, DA UNIVERSIDADE HOSEI, E CRÍTICO DE ARTE (II)

A respeito da Xilogravura Ukiyo-e

Dr. Tanikawa: Constam desta exposição as “Cinquenta e Três Estações” impressas pela Hoeido. O Sr. Kodo Nomura, autor da série “Zenigata Heiji Torimonocho”, possui bons exemplares daquela mesma edição. O Sr. Nomura talvez seja o maior colecionador de Hiroshige no Japão. Existem várias impressões das “Cinquenta e Três Estações”, mas a melhor é a da Hoeido, não?

Meishu-Sama: “As Oito Paisagens de Edo”, de Hiroshige, são também boas peças, não acha?

Dr. Tanikawa: Contudo, diga-se o que for, a obra-prima de Hiroshige trata-se da Neve, Luar e Flores. A sequência formada de três quadros é o que há de melhor, não? É difícil encontrarmos exemplares completos desta obra. Além das citadas, existem várias outras famosas. Como também comentam os ocidentais, todas aquelas que tratam da temática da chuva e da neve são ótimas. Por isso, gosto da Neve, Luar e Flores.

 

(Diante das “Trinta e Seis Vistas do Monte Fuji” de Hokusai)

Meishu-Sama: Também não existem muitos exemplares completos desta obra. Muito embora eu ache que, ao invés de se procurar completar a série, o importante seja encontrar um bom número das melhores vistas. Afinal, não é preciso ver todas as trinta e seis.

Dr. Tanikawa: De todo o conjunto, eu gosto de verdade apenas de três vistas: “Brisa de Verão em Céu Límpido” e “Chuva de Verão no Sopé do Monte”: aquela em que o Fuji aparece enorme, com o céu encarneirado; a da neve e aquela em que há um vagalhão. Gosto destas três, o resto não me interessa.

Meishu-Sama: É um despropósito comprar aquelas em que aparecem figuras estranhas.

Dr. Tanikawa: Há uns trinta anos andei comprando algumas peças do Monte Fuji: uma das melhores obras com este tema é a citada “Brisa de Verão em Céu Límpido”. Trata-se de uma obra mundialmente famosa, sendo excelente. É a obra-prima de toda a produção de Hokusai. A matriz também conserva-se em bom estado, não?

Meishu-Sama: Como o senhor avalia este exemplar?

Dr. Tanikawa: Muito bom. Todavia, o aspecto das nuvens é por demais denso. Falta-lhes graça. Há exemplares mais arrojados. Além do mais, o céu deveria parecer mais alto, sendo de cor mais clara. Se estivesse mais claro, as nuvens flutuariam. O tom deste vermelho, caso fosse mais acentuado, ficaria melhor. Esta “Chuva de Verão no Sopé do Monte” é ótima. A reprodução executada pelo Sr. Takamizawa, na Era Taisho, é perfeita: ele executou um trabalho idêntico em todos os detalhes, inclusive os defeitos. Como os especialistas tornaram-se incapazes de discernir o original, todas as peças passaram a receber a classificação de reprodução. Dentre as obras posteriores às de Harunobu, gosto destas três e da série “Neve, Luar e Flores”, de Hiroshige. Das obras anteriores, gosto de todas. Gosto também de Kiyonobu, Kyomasa, Sukenobu e outros. São ótimas todas as obras monocromáticas, impressas a nanquim, anteriores às coloridas (nishiki-e). Pertencem a uma fase anterior à da impressão em que se dava predominância ao vermelho (benizuri-e), tendo sido idealizadas depois das obras em preto e branco. Gosto, ainda, das peças impressas com laca, chamadas urushi-e. O mestre da modalidade benizuri-e é Toyonobu; Harunobu, do gênero nishiki-e.

Meishu-Sama: Há uma extraordinária pureza aí, não acha?

Dr. Tanikawa: São belas. Tem-se, depois, a obra de Kiyonobu. A de Utamaro também é boa, mas – como diria – o que se sente é algo já em decadência.

Meishu-Sama: Falta-lhe classe, não é?

Dr. Tanikawa: Sim. Contudo, mesmo depois de Harunobu, a obra de Sharaku é boa. Trata-se de uma existência intrigante e particular.

Meishu-Sama: A obra de Kiyonaga é boa, não acha?

Dr. Tanikawa: Eu classificaria assim: Sharaku, Utamaro e Kiyonaga. Outro dia veio parar em minhas mãos uma peça de cerâmica chinesa negra. É algo incrível. Artistas como Picasso, se a vissem, ficariam boquiabertos. Este gênero de peça foi desenterrado uma única vez, sendo, pois, conhecidos todos os exemplares existentes.

 

(Diante de xilogravuras de Harunobu)

Dr. Tanikawa: Haronobu é realmente excelente. Além disso, estas peças encontram-se em estado de boa conservação. No campo da xilogravura ukiyo-e, Packard era um expert.

Meishu-Sama: Já ouvi o nome.

Dr. Tanikawa: Este senhor levou boas peças consigo e, por estarem extraordinariamente bem conservadas, lá as tiveram todas por falsas – já que não conheciam peças em tal estado de conservação. Este Harunobu é muito bom. É intrigantemente belo. Em toda a obra de Harunobu, não existem senão duas peças com o fundo em vermelho, tratando-se, pois, de um exemplar extremamente raro. Quando digo duas peças, não significa que existam apenas dois únicos exemplares, mas sim duas gravuras. A presente – do tear – e outra em que se apanha água. Esta última encontra-se em um museu. Por isso, Kondo dizia existir apenas uma gravura. Eu, depois do fim da guerra, vi esta pela primeira vez, numa reunião de chá, em Kawasaki. Trata-se de uma obra raríssima. Ademais, seu estado de conservação é ótimo, não? Ao todo, são quantas peças?

Meishu-Sama: Seriam dez?

Dr. Tanikawa: Por ser uma obra rara, lembro-me perfeitamente dos temas. Naquela oportunidade, havia dezesseis peças. Esta obra de Harunobu, seja pelo tema, pela conservação e, sobretudo, por contar com estas gravuras com o fundo em vermelho, é excelente. Eu não aprecio muito Harunobu, mas esta obra me deixa com água na boca. Caso esta gravura do tear constar de alguma de suas exposições de ukiyo-e, virei aqui especialmente para apreciá-la.

 

(Diante de xilogravuras de Toyokuni)

Meishu-Sama: A cor das vestimentas é boa, não é?

Dr. Tanikawa: Sim. Toyokuni mostra-se frequentemente grosso, mas estas peças são boas. Além disso, possuem muita energia.

Meishu-Sama: Pois não. Acresce, ainda, que o colorido é bem refinado.

Dr. Tanikawa: O senso de coloração do gênero ukiyo-e é bastante refinado. Gosto destas obras da época em que se imprimia o contorno em nanquim, colorindo-se, depois, a gravura a mão. Quem se encarregava deste trabalho eram aprendizes, fazendo-o de qualquer maneira. Encerra-se aqui, porém, um interessante sabor.

Meishu-Sama: De fato, tem um excelente sabor.

Dr. Tanikawa: A primeira impressão de obras como esta estava restrita a trezentos exemplares. Caso sua vendagem fosse boa, imprimia-se mais. Todas as peças desta série de Toyokuni são ótimas. A obra “Trinta e Seis Paisagens do Monte Fuji”, em cotejo com esta, excetuando-se algumas peças, perde. Se bem que este seja um parecer oriundo do meu gosto pessoal. Penso não haver necessidade de Vossa Reverência adquirir todas aquelas peças. De uma perspectiva artística, as peças realmente boas são apenas algumas. Na exposição sobre o Japão, que realiza agora nos Estados Unidos, a obra que foi daqui é apenas a “Banhista”?

Meishu-Sama: Sim.

Dr. Tanikawa: A “Banhista” é uma excelente peça, não?

Meishu-Sama: Acho que pode ser considerada a melhor obra de todo o gênero ukiyo-e, concorda?

Dr. Tanikawa: Tem-se a “Banhista” e o “Biombo de Hikone”, mas, como este é uma peça de grandes dimensões, na verdade, aquela é a primeira. O “Biombo de Matsuura” também é famoso, contudo fica muito aquém do “Biombo de Hikone”.

Meishu-Sama: Quanto à pintura, o que há de melhor é a das dinastias Sung e Yuan, não acha?

Dr. Tanikawa: Concordo plenamente. Também no ano passado a obra “Han Shan e Shih Tê”, de Liang Chieh, estava exposta, não é?

Meishu-Sama: Trata-se de uma peça esplêndida, dotada de graça.

Dr. Tanikawa: Simplesmente esplêndida. Digam o que disserem, é inegável que a obra de Liang Chieh seja a primeira do mundo. Dele e de Mu Hshi.

Meishu-Sama: A pintura destes dois é incrível, não?

Dr. Tanikawa: A obra “Martim-Pescador e Lavandisca”, de Mu Hshi, a qual vi no ano passado, desta vez não foi exposta, não é?

Meishu-Sama: Exatamente. Este ano ainda não a expus. Depois, aquela paisagem de Ma Yüan é muito boa. Ouvira dizer que ela teria outro paradeiro; fiquei feliz em tê-la encontrado aqui. Foi uma pena não estarem expostos os originais dos afrescos de Tung Huang.

Jornal Eiko nº 212
10 de junho de 1953