MINHA CRÍTICA SOBRE PINTURA

Não posso deixar de me lamentar profundamente quando analiso o mundo hodierno das Artes, em particular, o da Pintura. É que o próprio pintor não discerne nada da verdadeira essência da Pintura. Gostaria de expor acerca de variados aspectos, mas, aqui, limitar-me-ei a alguns que, conquanto sejam de suma importância, parecem passar desapercebidos. Temos, em primeiro lugar, a missão original da pintura. A essência da Pintura em si não reside no simples deleite do artista. Se o problema se encerrasse nesse aspecto, não haveria, então, diferença alguma com o ato de uma criança divertir-se com os seus brinquedos. Caso exista semelhante pintor, sua existência é inútil, e poder-se-á dizer que ele não é outra coisa senão um parasita. Consequentemente, o pintor deve trazer firmemente consigo a conscientização do porquê de ter nascido e do que deve fazer. A esse respeito, penso eu da seguinte forma.

Onde reside o significado da existência do pintor? Reside em proporcionar prazer visual ao maior número possível de indivíduos e, através dos olhos, sublimar o espírito deles. Elevar o nível espiritual, torná-lo melhor, fazê-lo mais belo — essa é a verdadeira atividade pictórica. De fato, a expressão da personalidade, a liberdade do espírito criativo, bem como a temática, são fatores importantes, e não há sentido algum em ultrapassar esses limites. Contudo, ao observar a pintura recente, não posso jamais assistir calado as suas aberrações. As pessoas de bom senso estão franzindo o cenho diante dessas obras, por serem elas estranhíssimas. Por maior que seja a boa vontade com que as vejamos, não expressam a menor beleza — são horrendas, e, mais do que desagradáveis, chegam mesmo a provocar a ira.

Aqueles que executam com afetação esse tipo de pintura, ao invés de manifestar sua personalidade, transmitem uma intenção subjetiva. Semelhantes quadros, quando deveriam sublimar a alma do admirador, despertam um efeito contrário. Toda vez que vejo quadros assim, sinto-me contrariado pelo desperdício de tela e tinta. Não serei só eu quem pensa desta forma. Por não haver motivo de tais quadros serem vendidos, ouço amiúde dizerem das dificuldades financeiras que cercam aqueles artistas. Desse modo, além de em nada contribuírem para a sociedade, eles próprios se veem em apuros. Diante dessa ocorrência inteiramente negativa, acredita-se que deveriam perceber o seu engano, mas de tal não há nenhum indício. É de se julgar, então, que é um tipo de demência. Eles próprios não devem saber a razão de estarem vivendo. Como existências vãs, são realmente dignos de piedade. Caso, despertando para a realidade, não voltem para a trilha correta, eles perderão quem os leve a sério, rumando diretamente para a destruição. O que acabo de comentar concerne à Pintura ocidental. É provável que todos compartilhem do meu pensar, uma vez que ouço muitas críticas pertinentes. Contudo, desejo falar algo que ninguém parece notar. Quero dizer que, originalmente, o verdadeiro âmago da Pintura é a sua dignidade, a sua altivez. Tais qualidades são quase que inerentes à Pintura oriental, sendo, porém, pouco ou quase que inexistentes na ocidental. Verdade é que esta por si mesma é mais popular e, pelo caráter de inseparável da vida das massas, a falta das referidas qualidades torna-se inevitável. Mesmo assim, a pintura ocidental deve possuir o seu sabor peculiar como tal. Todavia, o problema da Arte hodierna não está na nobreza ou baixeza de nível. O âmago de sua beleza já se perdeu há muito, nada restando nela. A impressão que se recebe desses quadros é a própria fealdade; nada mais que mal-estar, antipatia, cólera, desespero. Tais pintores formam um tipo de anormalidade mental. Por isso, toda vez que compareço a exposições assim, eu imagino que, se os pacientes de um hospício organizassem uma mostra, ter-se-ia algo idêntico.

Desejo, ainda, discorrer um pouco sobre a Pintura japonesa. É plausível afirmar que também esta, ultimamente, perdeu muito no que diz respeito à classe; vale notar, todavia, que a classe é, originalmente, uma das características da Pintura do Oriente. Sempre ao ter contato com pinturas de renome da China e do Japão, assumo naturalmente uma postura de respeito, impressionado pela sua nobreza. No entanto, os pintores japoneses da atualidade são quase que inteiramente indiferentes a esta quinta-essência da Pintura oriental. Ela remanesce apenas em uns poucos grandes mestres, existindo entre os artistas jovens a tendência de se deixarem levar pela Pintura ocidental. É verdadeiramente preocupante. Julgo que, se eu não despertá-los no tocante a isso, enquanto é tempo, o futuro será sombrio.

Desejo explanar, aqui, sem discutir a diferença entre as pinturas nipônica e ocidental, mas englobando todas as artes, sobre o verdadeiro significado da Arte. Desnecessário dizer que tal acepção é, claro, não só o aprofundamento do intelecto, mas a condução do espírito do contemplante a um estado elevado, pela transmissão da alma do artista através dos olhos daquele. Tão somente deleitar os olhos equipara-se a um espetáculo circense ou de "strip-tease"; não se trata de Arte. Essa observação aplica-se tanto ao artista plástico, como ao escritor, ou àquele que se relaciona com o teatro, a dança ou demais entretenimentos. Faz-se mister extrair, o pouco que seja, a animalidade inerente ao ser humano, apelando para o coração do público por intermédio das Artes. É necessário enriquecer o que há de cultural no homem. Excetuando-se tal objetivos, não há outra razão de existência para as Artes. Então, o mais importante nelas é a objetividade. Quanto maior a objetividade, maior o valor artístico. Por mais que o artista considere excelente a sua obra, caso esta não tenha aceitação na sociedade, não será outra coisa que cédula sem lastro. O que tais artistas chamam de manifestação da personalidade não é mal; contudo, com isso apenas, o que se tem é uma modalidade de fascismo representado pela imposição da subjetividade. É preciso, custe o que custar, comprazer-se com o grande público. Contemplem-se acuradamente as obras daqueles considerados os grandes mestres da Antiguidade. Sua arte possui ampla abrangência, ainda hoje permanecendo vívida a técnica sobre-humana de encantar e deleitar tanto a elite intelectual quanto as massas.

Quero expor, a seguir, sobre a Literatura japonesa contemporânea, para falar, sem cerimônia, sobre o seu nível extremamente baixo. Os escritores atuais aspiram tão somente a serem badalados como autores da moda, e para tal adulam o grande público, tirando proveito das tendências vulgares em voga. Não têm ideais ou coisa que os valha. Basta que a sua produção seja filmada, rendendo lucros — o que transparece nitidamente nessas obras. São interessantes, enquanto lidas ou vistas, nada mais restando de proveitoso. São idênticas a pratos que só sabor possuem, mas não nutrem. Consistem em entretenimento que proporciona satisfação passageira da curiosidade. Não serei apenas eu a me preocupar com o perigo de tais obras de arte baixíssimas suscitarem a criminalidade pelo embrutecimento do caráter das massas. Verdade é que, ainda assim, não deixam de existir, às vezes, obras que questionam a sociedade, expondo as suas falhas, ou nas quais o autor clama pela sua opinião. No caso do Japão, porém, tal aspecto é superficial e diminuto. Não se descobrem obras capazes de estremecer de verdade a alma do leitor. Julgo que o motivo disso está na ausência do sentimento religioso na classe de escritores japoneses. Coloquemos em confronto essas obras com um Shakespeare, um Tolstoi, um Hugo, um Ibsen, um Bernard Shaw. São de uma escala grandiosa, afluindo deles uma crítica aguda da civilização, uma filosofia revolucionária, um senso de justiça religiosa que impressiona a alma de quem os lê. Eles continuam a conquistar o espírito das massas desde quando foram produzidos até os dias de hoje. O que será essa energia senão a nobreza da Arte?

Eis aqui o que escrevi ao sabor do que me vinha à mente. Se porventura os jovens artistas aceitarem algo, por mínimo que seja, da minha tese, dar-me-ei por satisfeito.

Jornal Eiko, nº 103 — 9 de maio de 1951

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