NINSEI NONOMURA

Ninsei (仁清) era um oleiro japonês, que viveu no período Edo, aproximadamente entre as décadas de 1640 e 1690. Ele nasceu Nonomura Seisuke, e mais tarde recebeu o primeiro nome Seiemon.

Tempos depois, por volta de 1624, inicia seus estudos em Awataguchi. Depois de se aperfeiçoar durante anos em Seto, Owari, que é a sede dos fabricantes de potes para chá, retorna a Awataguchi e começa a se empenhar nesse ofício. Exatamente nessa mesma ocasião, Kanamori Sôwa (1584–1659), o expoente máximo em chá dessa época, queria abrir uma nova olaria e procurava por um bom ceramista. Talvez possamos chamar a isso de acaso do destino, mas foi exatamente a ele que Sôwa designou para essa olaria. Seiuemon de Nonomura, Tanba = Nonomura Seiumon. Desse encontro, surgiu a olaria “Onshitsukama” em frente ao Templo Nin’na de Rakusei, e Seiuemon dedicou-se à criação de peças de cerâmica. Foi a partir desse momento que Nonomura Seiuemon passou a utilizar o nome de Ninsei, usando um selo para se identificar assim. “Ninsei” é um apelido criado a partir da combinação de “Nin” do Tempo Nin’na e o “Sei” de seu nome. “Adotando o nome de Ninsei, passou a gravá-lo nas cerâmicas”. Assim, a cerâmica de Kyoto propriamente dita começa com Ninsei.

Um pouco antes disso, por volta de 1603, quando Tokugawa Ieyasu (1542–1616) ocupou o cargo de xogum, o Sr. Nabeshima, senhor do feudo de Saga em Kyushu, foi para Kyoto e participou de uma Cerimônia do Chá com Furuta Ayabe e Kuroda Yoshitaka ou Josui (1546–1604), entre outros. Lá, ouviu o boato de que na região da Terceira Avenida de Kyoto haviam surgido cerâmicas ao estilo da cerâmica Bizen e ficou bastante irado ao perceber que a técnica de cerâmica Karatsu, produção tão valiosa de sua região, tinha sido roubada pelos ceramistas de Kyoto. Foi nesse período que os ceramistas construíram uma olaria na região de Awataguchi, próximo do sopé da Montanha Higashi que fica ao leste da Terceira Avenida.

Cerâmica Ninsei

Na cerâmica existe a porcelana jiki e tôki, mas ambas são feitas de argila. A diferença está no esmalte aplicado. Entre as do tipo tôki, há a cerâmica Hagi, de cores bem claras, e a Bizen, de cores sóbrias e diversas outras colorações. No entanto, quase não se vê cerâmicas com desenhos ou estampas na superfície. Enquanto o tipo jiki, de superfície lisa, é mais fácil para aplicar desenhos e cores, o tôki, de textura especial, é altamente absorvente. A coloração não fica satisfatória com a aplicação de desenhos, de modo que é preciso apostar na cor da cerâmica. Por outro lado, o jiki, mais adequado para se colorir e desenhar, é próprio para se apreciar os desenhos e estampas, mas como a superfície é escorregadia, sua textura é simples. O tôki não é adequado para o desenho, porém sua textura possui um toque especial que o jiki não tem. Foi nesse ponto que Ninsei concentrou seu talento. Seu maior sonho era aplicar o desenho sem afetar a textura do tôki e fabricar um pote no qual o desenho sobressaísse nessa sua textura especial.

Depois de muitas experiências malsucedidas, Ninsei teceu um plano. Fazer uma primeira queima da cerâmica, aplicar uma base de esmalte para que a superfície ficasse lisa, levar ao forno mais um pouco e aplicar o desenho. Em seguida, passar mais uma vez o esmalte e fazer uma última queima. Esse era o processo pelo qual ele teve a ideia de fabricar o pote.

Descrito dessa maneira, parece extremamente simples, mas, mesmo no que diz respeito à variedade do esmalte, há, entre outros fatores, a necessidade de se saber qual esmalte-base aceitará bem o material de pintura; como ficará a combinação do esmalte com a cor depois da queima; qual deve ser a temperatura da primeira e da última queima. Sob a orientação de Kanamori Sôwa, Ninsei repetiu inúmeras experiências malsucedidas nesse embate no mundo da cerâmica, avançando numa área peculiar como ceramista, aperfeiçoando-a e engrandecendo-a.

O pote de chá com desenhos coloridos de glicínias

A obra-prima da cerâmica Ninsei é o Tesouro Nacional Pote de Chá com Desenhos Coloridos de Glicínias, do qual o Museu de Artes MOA se orgulha perante o mundo. Diz-se que foi criado para fazer parte dos acessórios especialmente encomendados para a casa em construção de Kyôgoku Kôhô, segunda geração da família Kyôgoku, senhor do feudo de Marugame de Shikoku.

Ele tem 30 cm de altura e uma boca com 10 cm de diâmetro. Ninsei, mestre do torno, conseguiu, mesmo num pote de tão grandes dimensões, confeccioná-lo com uma espessura fina e uniforme sem prejudicar sua imponência, dando-lhe um acabamento resistente e impressão de firmeza. Queimou em cor branca apenas 5/6 do vaso a partir da boca e, dando vida à textura da cerâmica tôki, fez com que um mestre de pintura do Estilo Kanô fizesse o desenho, para então colorir com vermelho, azul, prata envelhecida, dourado e outras cores. Essa obra possui algumas peculiaridades. Primeiro, a beleza do torno de Ninsei, considerado um mestre nessa técnica. O desenho feito pelo mestre de desenho do estilo Kanô não é plano. Os cachos de glicínias são desenhados em forma de raios que começam a partir da boca do pote e estão inseridos tridimensionalmente no formato esférico do pote, mostrando-se variados quando vistos de ângulos diferentes. O mais importante é que no fundo do pote há uma inscrição pequena em formato oval, gravada com o selo de Ninsei no centro à esquerda. Ninsei foi o primeiro ceramista a gravar seu selo numa obra, prova de sua intenção em elevar a cerâmica, que era um simples utensílio do dia a dia, à categoria de obra de arte, fazendo-a, assim, renascer.

Vale lembrar que, no Japão, existem, no total, 1.037 obras classificadas como Tesouro Nacional, e, dentre elas, as peças em cerâmicas são apenas catorze. Nove delas são de produção estrangeira e apenas cinco de produção nacional, das quais duas são da autoria de Ninsei.

A trajetória até o Museu de Belas-Artes MOA

Originariamente, era o Museu Nagao quem possuía o Pote de Glicínias. No final de 1954, ele foi colocado à venda, e Yamazaki Yoshishigue, diretor do antigo Museu de Belas- Artes Messiânico, certificou-se da existência do pote que estava no depósito subterrâneo do Banco Mitsui. Ele relatou o fato a Meishu-Sama, que assim expressou sua vontade: “Quero-o muito. Seus desenhos possuem movimento e gosto demais deles, por isso gostaria de conseguir um jeito de adquiri-lo”. O valor, em se tratando de Tesouro Nacional, era mais de 30 milhões de ienes. Mesmo a grandiosa Igreja Messiânica Mundial não possuía um capital disponível nesse montante. Então, depois de muitos arranjos, decidiu-se comprar o pote com o dinheiro que adviria de um acordo pela entrega de um terreno de três mil tsubo  do Solar da Montanha Preciosa em Tamagawa, que, por longos anos e por motivo de divisa, estava em disputa com o Sr. Gotô Keita (1882–1959), da empresa Tôkyû. Vem daí o comentado episódio da troca de “três mil tsubo por um tsubo”.  O preço de compra real foi de 36,5 milhões de ienes. Pode ser uma preocupação inútil, mas procurando saber quanto isso equivaleria nos dias atuais, consultei o Banco do Japão e fui informado de que “No Banco do Japão, os cálculos são baseados na cotação do dólar. Comparado aos anos 1930 da Era Shôwa (1955–1965), o dólar subiu cerca de quatro vezes”. Fazendo-se a conversão, equivaleria a aproximadamente 150 milhões de ienes. O Pote de Glicínias, Tesouro Nacional, custa 150 milhões de ienes… É… Isso é motivo de gratidão! Foi até barato… Achando, porém, que havia algo de errado, fui perguntar na Secretaria do Distrito de Setagaya qual era o preço do terreno da região onde se localiza o Museu de Artes Goshima. E a resposta foi: o preço oficial no ano de 2002 da região de Kaminogue era de 625 mil ienes o metro quadrado. Se este é o valor, 1 tsubo, que equivale a 3,3 vezes, valeria aproximadamente 2.060.000 ienes. A área entregue foi de três mil tsubo, ou um valor equivalente a três mil vezes. Fazendo as conversões, chega-se a um valor de cerca de 6,2 bilhões de ienes. Fiquei de queixo caído. Essa cotação está em valores oficiais, de modo que o preço real deve ter sido maior. Com um valor surpreendente como este, houve a suspeita de que “não haveria motivos para utilizar uma soma enorme como esta para a aquisição de um único pote e esse dinheiro deveria estar sendo utilizado ilicitamente para fins políticos ou para o caixa dois da entidade religiosa”. E o Sr. Yamazaki, que fora encarregado da transação, sofreu com interrogatórios. O pote foi entregue a Meishu-Sama no dia 8 de fevereiro do ano seguinte, dois dias antes de ele retornar aos céus. Ele foi classificado como Tesouro Nacional em junho de 1951.

Os discípulos de Ninsei

Quem se tornou um dos discípulos de Ninsei e se empenhou ardentemente no aprendizado da cerâmica foi Ogata Kenzan (1663–1743), o irmão mais novo de Ogata Kōrin (1658–1716). O livro que registra os ensinamentos do mestre e as obras que ele mesmo elaborou é o já citado Conhecimentos necessários de cerâmica. Esse livro registra seus sentimentos em relação à cerâmica: “Ninsei fabricou exclusivamente potes de chá a gosto do velho mestre de chá Kanamori Sōwa”; “cada peça sempre precisa brilhar com uma rica individualidade, sem nunca cair na mesmice”. Kenzan, ao tornar-se independente, abre uma olaria em Narutaki e, como ela se localiza na montanha (zan) a noroeste (ken) do Templo Nin’na, adotou o nome de Kenzan. Por isso, originariamente, Kenzan era o nome da olaria, uma marca comercial. No entanto, não se sabe quando passou a ser divulgado como o seu próprio nome.

Dessa forma, Kenzan empenhou-se com todo o fervor no aprimoramento de sua arte, retraindo-se sob Ninsei, mas Kōrin, seu irmão mais velho, via Ninsei com outros olhos. Talvez pelo amor fraternal de irmão mais velho, escreveu um texto advertindo a propensão de Kenzan para Ninsei. Eis o texto original:

“Peço-lhe desculpas pelo inconveniente de escrever-lhe reiteradas vezes. Bem, mesmo que o pote de chá de Seiuemon do Templo Nin’na seja uma obra expoente que perdure pela eternidade, e mesmo que ele seja exímio no tocante à inserção de gravuras, não se trata de uma pintura, é apenas um desenho. Obviamente, um artesão precisa se preocupar com a avaliação sobre a sua habilidade em conduzir o pincel, mas nunca deve se esquecer do sentimento. Sem o sentimento, o pincel não desliza; a beleza que se tem diante dos olhos fica desprovida de valor, e a pintura perde a vida. É como os trajes de uma cortesã. Acredito que seja uma grande vergonha um artesão se deixar levar pelas influências do momento.

“Algo do qual você deve se precaver é de admirar Seiuemon que, nesta ocasião, caiu nas graças do Sr. Nijō para fabricar-lhe os potes de chá. Oro para que alcanceis vossa arte a partir de um sentimento íntegro proveniente de seu interior. Se tiver um dia livre, pretendo sair da vila para ir até Narutaki dar uma olhada em seus trabalhos. Por isso envio essa carta.”

Kōrin (8 de agosto de 1703)

Parece que Kōrin não gostava das maneiras de Ninsei. O pote de chá ao qual se refere no texto diz respeito ao Pote de Glicínias do Museu MOA e reconhece que ele é, de fato, uma obra de peso, mas o critica dizendo que não é uma pintura, que não passa de um desenho. Expressa seu amargor afirmando que, como pintor, a coisa mais importante a se preocupar é com o “sentimento”. Ao falar que sem o sentimento o pincel não desliza, ele quis dizer que sem desenhar a alma não se consegue fazer uma pintura ter vida, que a beleza meramente visual é desprovida de qualquer valor. Uma mulher com lindas roupas não é bela, pois, mesmo que a roupa seja maravilhosa, o fato de a mulher que a veste ser bonita ou não é outra questão. (É bem característico de Kōrin trazer a mulher como exemplo.) Ao saber que ele estava se empenhando na criação de potes de chá para a família Nijô, incentivou-o com advertências, orando para que Kenzan se despojasse do deslumbre que sentia pela beleza criada por Ninsei e produzisse obras fiéis a seu próprio sentimento, que afluíssem verdadeiramente de seu íntimo.

Dessa forma, Ninsei e Kōrin, pela própria natureza deles, tinham diferentes posturas em relação à arte. Estando no meio dos dois, Kenzan deve ter sofrido muito por ser bastante sério e dedicado. São três artistas distintos, mas o interessante é que Meishu-Sama apreciou a todos eles.

Leia aqui o Ensinamento do Mestre Jinsai sobre Ninsei!

Veja aqui mais explicações sobre o Pote de Glicínias!

 
 

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