A ARTE JAPONESA E SEU FUTURO

1 - A Pintura

Ao abordar a Arte japonesa, pretendo fazê-lo dividindo em três partes: Pintura, Escultura e Artesanato.

Primeiramente, a Pintura. É possível afirmar que a Pintura japonesa atual se vê em face a um momento crítico. Trata-se de opinião unanimemente compartilhada por todos aqueles que têm interesse por este ramo da arte que a situação não é fácil. Escusado dizer que a Pintura japonesa enfrentou uma grande fase de transformações no período que se estende do final do xogunato Tokugawa até a era Meiji, e que as demais artes e artesanato se viram também envolvidos. Cito como pintores que se mantiveram vivos, tendo ultrapassado essa situação, depois de muito se debaterem, os seguintes: Tyokunyu, Zenin, Yosai, Fuko, Hogai, Gaho, Yoshitoshi, dentre outros. Os pintores pósteros jamais devem se esquecer de que eles venceram as adversidades, tendo lutado contra a miséria e guardado até o fim a última fortaleza. Foi nessa época que Gaho logrou, a muito custo, matar a fome, tornando-se vendedor de antiguidades. Posteriormente, quando a situação social se acalmou, e, com isso, aconteceu também esse ramo ter-se recuperado, o mundo viu o estabelecimento de escolas de Belas-Artes, museus e exposições — em especial a Exposição de Artes do Ministério da Educação. Eis que, finalmente, a primavera visitou os círculos da Pintura. Não obstante, o mundo da Pintura japonesa não conseguiu escapar do limiar da cega obediência às tradições. Todavia, o Instituto de Artes, criado sob os desígnios revolucionários do mestre pintor Tenshin Okakura, veio, repentinamente, lançar uma bomba atômica sobre o mundo da Pintura do estilo nipônico. Os pintores centrais deste movimento são quatro, a saber: Taikan, Shunso, Kanzan e Buzan. A intenção do Instituto de Artes estava, como já mencionei, no tópico acerca de Korin, em reabilitar este artista na atualidade. Em vista, no entanto, da imaturidade da ocasião, eles foram, inicialmente, tratados com menosprezo, sendo chamados pelo nome de escola da opacidade. Todavia, a sociedade, sedenta que estava de algo novo e insatisfeita com o antigo estilo de pintura, não conseguiu descartá-los. A sorte abençoou lépida este movimento. Não é preciso dizer que ele dominou os círculos pictóricos avassaladoradamente, podendo-se afirmar que operou neles uma verdadeira revolução. À parte temos, ademais, atuando com um trabalho conjugado, o grande mestre Gyokudo, dono de um estilo suave e particular. Em Quioto, surgiu como a estrela-d'alva o talento raro de Seiho Takeuchi, e Tessai Tomioka, outro senhor de um estilo peculiar, ambos ocupando uma posição de importância naquela metrópole do oeste. Graças a eles, finalmente o apogeu da Pintura nipônica eclodiu. Contudo, Shunso morreu jovem, sendo seguido de Kanzan e Buzan. Em Tóquio, hoje, restaram apenas Gyokudo e Daikan, a sustentar o mundo da Pintura nipônica prestes a ruir. Também em Quioto, Seiho e Tessai faleceram, assim como faleceu, jovem ainda, Kansetsu, a quem julgavam mesmo o sucessor da obra dos dois primeiros. Tanto no leste como no oeste, o mundo da Pintura japonesa ficou vazio como um teatro.

O que acabo de expor acima diz respeito aos grandes mestres anciãos. Devem ser apontados, como candidatos a ocupar futuramente tal posição, em Tóquio, Kokei, Yukihiko e Seison — três grandes artistas da escola do Instituto de Artes. Todavia, estranhamente, aos dois primeiros, pela saúde débil, falta vigor, o que transparece também em suas obras. Seison, ademais, nestes anos recentes, mostra-se desanimado, não se podendo, pois, esperar, por um bom tempo, grandes peças da parte deles. É, realmente, uma grande pena. De resto, tem-se a existência de Ryushi Kawabata, a guardar uma base solitária. Sua técnica é excelente, bem como é transbordante a sua garra. O que é lamentável, porém, é que seu estilo se assemelha à comida chinesa, sendo um pouco pesado, e o fato de ele apegar-se à teoria da "arte de recinto", não tendo ainda despertado para a falácia que ela representa. Excetuando-se esses dois pontos, ele possui, suficientemente, as qualidades exigidas de um grande mestre. Em Quioto, Goun e Keisen faleceram; Insho é doentio e sem ânimo; resta só Heihachiro Fukuda. Todavia, apesar do talento que possui, sua técnica deixa a desejar; infelizmente, talvez, ele não seja capaz de escapar da fase de estagnação. Por conseguinte, em se examinando o futuro do mundo da pintura japonesa, é difícil vaticinar o seu paradeiro.

Aqui, eu intenciono apresentar minha opinião bem franca a respeito da razão que conduziu os círculos da Pintura nipônica ao declínio — a moda da pintura de recobrimento. Fazendo uma avaliação imparcial, eu concluo que a Pintura japonesa de hoje não se trata de Pintura. É a técnica artesanal do recobrimento. Posso estar sendo cruel, mas penso que ela se enquadra mais na área do Artesanato artístico do que na da Pintura. É a completa decadência. Desse jeito, diluir-se-á mais e mais o interesse por ela. Eu mesmo adoro a pintura, mas não tenho o mínimo interesse por peças produzidas com a técnica de recobrimento. Talvez esta possa ser uma opinião exclusivamente minha, mas, ao cogitar sobre o futuro da pintura japonesa, depois de Taikan e Gyokudo ausentes, não consigo conter a onda de pessimismo que espontaneamente brota dentro de mim. Nesse sentido, somente as obras antigas poderão saciar a nossa sede de beleza. Não sei se a causa está em tal fato, mas ouvi dizer que todas as exposições realizadas este ano registraram déficit, em virtude da redução de público. Então, não posso ficar sossegado.

Tenciono falar agora um pouco a respeito da pintura antiga. Dentre tais obras, gosto, a começar das mais remotas, de Keishoki, Shubun e Soami; passando pelas chinesas, como as de Mu Hshi, Liang K'ai e Yin T'o-lo; bem como as de Motonobu, Tan-nyu, Sesshu e Sesson. Da época mediana, aprecio as de Korin — indiscutivelmente —, Sotatsu, Kenzan, Okyo e Matabee. No gênero xilogravura ukiyo-e, as de Moronobu, Harunobu e Utamaro. Na modernidade, devo citar, unicamente, as de Hoitsu; e, contemporâneas, as de Seiho, Taikan, Shunso, Gyokudo e Kansetsu.

Sobre elas, tentarei apresentar um breve comentário. Primeiramente, a técnica pictórica e o conteúdo das obras de Keishoki, Shubun, Mu Hshi, Liang K'ai e Soami, no âmbito da pintura antiga, resume-se no termo "maravilha". Não é exagero dizer que a excelência daquelas peças executadas dentro de um período que vai de 400 a mais de 700 anos passados, quando em cotejo com as obras dos grandes artistas atuais, torna estes últimos discípulos daqueles. Por maior que seja a atenção com que contemplemos aquelas telas, não lograremos descobrir um único defeito; mais que isso, delas afluirá, infinitamente, algo superior. Elas terão sempre alguma coisa a comover quem as contempla. Naturalmente, toma-se uma atitude de humildade perante elas. No tangente às peças de Motonobu, Tan-nyu, Sesshu e Sesson, não diria que todas elas são boas, mas, de vez em quando, há algumas de rara superioridade. Com respeito a Korin, por já ter escrito sobre ele no respectivo artigo, omiti-lo-ei. Sotatsu também apresenta peças superiores. Apesar de não ser tão arrojado quanto Korin, é de uma simplicidade acurada ao extremo. Desprevenidos, sorrimos diante de suas obras, e eu gosto incontidamente delas. Kenzan tem um sabor especial e, conquanto seu pincel seja um pouco duro e apresente características primárias, seu estilo nos prende. Okyo é convencional e impecável. De alta classe, logra sucesso em qualquer empreendimento: um mestre, enfim. Matabee, cujo outro pseudônimo é Katsumochi, demonstra exímia harmonia tanto no estilo yamato-e como no da escola Kano; suas obras possuem nobreza, sendo muito apreciáveis. Hoitsu, como todos sabem, é um cultor de Korin. Sua nobreza peculiar, sua técnica refinada e, por outro lado, o sabor da sua faceta de poeta, tornam suas obras atraentes.

Podem ser enumerados, como mestres da pintura moderna, Hogai, Gaho e Shunso; como pintores contemporâneos, citaremos três: Seiho, Taikan e Gyokudo. A genialidade de Seiho não admite imitadores. No que toca à sua técnica realista, ele introduziu, da influência de seus estudos no exterior, o estilo ocidental no uso das cores. A acuidade com que capta a sensação do objeto e a destreza de expressão não encontram par, seja hoje, seja na Antiguidade. Vale frisar que sua pintura é concisa ao extremo e que ele não descuida nem mesmo de um único ponto — uma técnica perfeitamente sobre-humana. Em oposição, quanta vulgaridade nos pintores atuais que, com traços e cores repulsivas, colorem tudo sufocadamente! Fico a cogitar no porquê de eles não compreenderem Seiho. Quero adquirir coragem para, com um só berro que condense o significado de milhões de palavras, alertá-los disso. Devo convir, entretanto, que a razão de eles rebuscarem seus quadros da mencionada maneira pode também advir da intenção de serem selecionados de qualquer forma para as exposições de arte, apelando para a complacência do júri, por intermédio de tinta e esforço.

Passemos a Taikan. Como um dos grandes mestres da escola que dispensa linhas, suas peças têm um sabor que transcende o mundano. Simples e elegante, sua técnica sobre-humana de expressar as coisas da natureza é oposta à de Seiho — que se apega demais ao realismo. Ele procede com cautela em meio à ousadia: sua maneira de expressão do objeto e sua técnica, bem como a atitude que ele assume com ar superior, ao postar-se num estado que lhe é característico, sem adular as massas, engrandecem-no. É de se lamentar somente que os seus temas sejam limitados. Quanto a Shunso, pode-se dizer que desempenha o papel de braço direito de Taikan. A suavidade de sua pintura é como um passeio por um campo na primavera, sendo agradável o seu estilo.

Gyokudo tem um sabor peculiar que é indescritível. Seus traços, sobretudo, são suaves e concisos. Sua técnica, demonstrando muito bem esse efeito, é incomum. O que em especial eu admiro nele é a sua falta de ostentação e ambição, seu desinteresse: á a sua invulgaridade que pode parecer vulgar. Ele expressa com perfeição a natureza, e sua forca de encantar quem contempla suas peças não admite rivais. Seu estilo é verdadeiramente profundo.

A obra de Tessai também é característica. Deve ser definida como a ordem da desordem: é infinitamente rica em interesse. Todavia, ele passou a pintar desta maneira depois de ter atingido os 60 anos. Assim, como viveu até os 89, quanto mais ele adentrava na idade, mais peças superiores produziu. Após seu passamento, acreditava-se que um segundo Tessai surgiria com Keisen Tomioka. A morte precoce deste foi realmente lamentável.

Com relação a Kansetsu, foi uma grande pena que ele morresse logo quando mais prometia. Na sua pintura, a ousadia que nela ocorre encontra-se envolta; sendo do estilo nanga, há tensão no uso do pincel. Além de não ser vulgar, transparece na mesma um sabor de quietude. Contudo, em virtude da sua juventude, era inevitável que a qualidade de suas obras não fosse constante. Se lhe fosse dado viver até depois dos sessenta, pelo menos, com certeza, ele teria atingido o grau de grande mestre.

2 - A Escultura

A seguir, discorrerei, brevemente, acerca da Escultura. Como artistas do passado, Unkei e Jingoro Hidari são por demais conhecidos. Todavia, no campo da Escultura, diversamente da Pintura, desde a Antiguidade, são poucos os mestres de renome. Ocupar-me-ei, aqui, somente da atualidade. É fato indiscutível que o florescimento registrado pela Escultura a partir da Era Meiji, como jamais se viu, contou com o estímulo das exposições. Citaremos, como os principais grandes mestres da Escultura em madeira, não só Komei Ishikawa, Unkai Yonehara e Tyoun Yamazaki — entre falecidos e já de idade avançada —, assim como também Dentyu Hirakushi e Chozan, o qual hoje adota o nome de Seizo, Sato. Dentre eles, eu gosto de Dentyu, não obstante ele ter perdido, recentemente, a vivacidade antes possuída. Hoje, apenas Seizo trabalha ativamente, produzindo obras relativamente boas. Embora sua ambição transbordante seja apreciável, seria de se desejar dele um pouco mais de refinamento e maturação. No mundo deserto da Escultura, ele tem todas as qualidades para se tornar um dos grandes nomes da atualidade. No que concerne à Escultura de bronze e argila, sou obrigado a apontar apenas Fumio Asakura. Contudo, não deve consistir em ponto de vista exclusivamente meu que sua técnica parece ter atingido o ponto final. Aqui, ainda deve ser feita menção especial à escultura budista da Antiguidade. É-me impossível acreditar que a refinada técnica empregada nas imagens religiosas do santuário Yumedono, do templo Horyuji, é coisa da Era Tempyo, de mais de 1.200 anos atrás. Ao pensar quando surgirão esculturas que suplantem estas, vejo-me obrigado a não acalentar grandes expectativas.

3 - Os trabalhos de laca

Abordarei, a seguir, o Artesanato artístico. Como na Pintura, ainda neste campo, a excelência dos antigos surpreende. Temos, primeiramente, a laca maki-ê, trabalho característico do Japão, não encontrado no exterior. Por isso, começarei por ela. A laca, tendo alcançado progresso há muito tempo, conta com magníficas peças de maki-ê datadas da era Heian. Naturalmente, muitos dos trabalhos dessa época estão ligados ao budismo, constituindo-se quase todos de urnas executadas em laca polida para o acondicionamento de sutras. A laca maki-ê teve maior impulso a partir da era Kamakura, passando pelo período Muromachi e alcançando imenso progresso nos períodos Momoyama e Edo, quando surgiu um sem-número de exímios artesãos. Os principais são, entre outros, Doho Igarashi, Shunsho Yamamoto, Kyui Koma, Kyuhaku e Seisei Shiomise, tendo eles deixado numerosas obras-primas. Até então, os trabalhos existentes eram unicamente de laca polida, mas, a partir dessa época, passaram a ser produzidas peças com adornos em alto-relevo. De outro lado, Koetsu Honnami e Korin Ogata fizeram grande sensação com desenhos e técnica completamente inovadores. Aplicando, com grande maestria, chumbo, madrepérola e kin-hira maki-ê, eles produziram peças nas quais não apenas o desenho peculiar é livre e arrojado, mas também nelas a elegância extravaza, contrapondo-se às primeiras, cuja suntuosidade prima pela delicadeza do trabalho. Temos, ainda, o trabalho inovador de Haritsu Ogawa, que combinou à laca o uso da cerâmica, e as peças de Shigemitsu Somata, originais no uso de lâminas delgadas de ouro e prata e de madrepérola. A arte da laca foi registrando, assim, relevante progresso. Sob as influências desse salto verificado no período Momoyama, o artesanato da laca ingressou na era Tokugawa com os grandes senhores feudais da época, competindo entre si na execução de obras-primas, estimulando o seguido surgimento de excelentes artesãos. A família Maeda, por exemplo, senhora do feudo de Kaga, um dos mais ricos da época, fazendo construir uma oficina em um recanto dos seus jardins, convidou artesãos para trabalharem na mesma, fornecendo-lhes, à vontade, o quanto fosse preciso em material e em paga pelo seu trabalho. Hoje, pode-se comprovar, pelo acervo dos museus de arte, quão suntuosas e esplêndidas são as peças produzidas graças a tal empenho. É possível conscientizar-se, outrossim, de que o Japão tem motivos de orgulhar-se diante do mundo inteiro por ser uma grande nação artística.

Na modernidade, surgiram os artesãos Hikobee, Bunryusai Kajikawa e Komin Nakayama. A laca maki-e, como as demais artes, depois de atravessar uma fase de decadência, dos fins do período Tokugawa até o início da era Meiji, avançou, subitamente, rumo ao seu apogeu. Os principais artistas são Zeshin Shibata, Shosai Shirayama, Shomin Ogawa, Taishin Ikeda, Iccho Kawanobe, Jitoku Akatsuka, Homin e Hobi Uematsu, Shumin Funabashi, Shuetsu Koda, Kosai Tsuzuki, Yukio e outros.

Vale fazer menção especial, aqui, a Shosai Shirayama. Talvez, ele ocupe o primeiro lugar no ramo, tanto na Antiguidade como hoje em dia, não sendo exagero afirmar que não há quem o ultrapasse. Ele é o grande mestre do mundo dos trabalhos de laca. Experimento respeito ao ver as peças por ele executadas. Sobre o referido artista, apesar de ter sido o primeiro membro da Comissão Real de Artes, ele não cobrava, na era Taisho, mais que quatro ienes e cinquenta centavos por jornada de trabalho. Seu desprendimento era completo, vivendo exclusivamente para a Arte. Um artista, na verdadeira acepção da palavra. Foi um grande mestre digno de respeito.

4 - A Cerâmica

Discorrerei também sobre peças de cerâmica. Como no caso da Pintura, também a cerâmica foi apreendida da China. Portanto, as peças iniciais de cerâmica japonesa são, na maior parte, imitação das chinesas. No período mais remoto, temos peças de Seto amarelas, Oribe verde, de porcelana verde-resedá, de porcelana azul e branca, de porcelana de Arita e de Hirado. Quanto às obras de cerâmica artística, foram iniciadas por Kakiemon. A seguir, Ninsei, ceramista de raro talento, surgiu em Quioto. Posteriormente, apareceu a porcelana Arita; de outro lado, em Quioto, surgiu a cerâmica Awata e a porcelana colorida de Kiyomizu. O estilo Ninsei difundiu-se e deu origem às peças Banko de desenho vermelho, da região de Ise. Posteriormente, produziram-se as peças do estilo brocado de Satsuma.

No período Kamakura, há aproximadamente 700 anos, surgiram, nas regiões de Owari e Seto, as peças antigas, hoje chamadas Seto. Ademais, perto de 1.200 atrás, no período Nara, produziram-se peças de cerâmica do estilo da porcelana verde-resedá, com o uso de esmalte fornecido pela cinza natural, havendo, ainda, no início do período Edo, a porcelana verde-resedá do Japão. Todavia, jamais se igualaram à produzida na China.

Kakiemon foi um famoso mestre ceramista do início do período Edo, que trouxe a inovação da porcelana colorida e do tipo brocado; os serviços que ele prestou em prol deste ramo da Arte o tornam seu grande patrono. Posteriormente, no período Genroku, a sexta geração de seus herdeiros tornou-se famosa pela produção de peças esplêndidas, graças à excelência de Shibuzaemon .

Eu gosto, sobretudo, da porcelana Okochi, também denominada Nabeshima, da região de Hizen. Ela começou a ser produzida na era Kyoho, constituindo-se, em sua maior parte, de pratos. A combinação nela presente da técnica da porcelana azul e branca com o inigualável desenho colorido deixa-me com água na boca. Atrai-me, inclusive, a porcelana do estilo brocado, popularmente conhecida como Imari. É também admirável o trabalho minucioso e a suntuosidade do colorido da cerâmica Satsuma. Todavia, tanto o desenho como a técnica atuais das três citadas modalidades, não são atraentes; pode-se dizer que somente as peças com mais de 200 anos são dignas.

As peças da porcelana Kutani, do estilo brocado, surgida há 300 anos, contudo, são apreciáveis. Entre as peças azuis e as coloridas, fabricadas pelo forno Yoshidaya, há, sobretudo, umas excelentes.

Entre os tópicos que pretendo abordar por último, inclui-se o do criador da porcelana Kyoyaki, o mestre Ninsei. Seu verdadeiro nome era Seiemon, da vila de Ninnaji. Como ceramista, pode ser considerado o primeiro do Japão. A imensa variedade de formas e desenhos e a infinita versatilidade de seu estilo fazem dele um gênio nato. A nobreza e a elegância de suas peças tornam-nas inteiramente distintas das outras cerâmicas. Existe um número razoável de taças para a Cerimônia do Chá e vasos de sua autoria classificados como tesouros nacionais. Sua posição é equivalente à de Korin no mundo da pintura. Seu grande mérito encontra-se em não se ter baseado, o mínimo que fosse, na porcelana chinesa — os demais estilos da cerâmica nipônica tomaram a China por modelo —, criando algo singular ao Japão. Neste ponto, a cerâmica Nabeshima, sendo também algo exclusivamente japonês, encontra-se emparelhada a ela — ambas contam, inclusive, com muitas obras superiores às da China. Outrossim — apesar de algumas características primárias — as peças de Kenzan são cheias de sabor. Por ser irmão de Korin, eles têm trabalhos realizados em coautoria.

Existem, ademais, peças muito boas na cerâmica Bizen. Principalmente entre os vasos para arranjos florais e os objetos de adorno de Bizen antigo e azul, há muitas obras excelentes, dignas de serem recomendadas. Eu gosto, também, da porcelana Shonzui. Existem, ainda, muitos tipos de porcelana do tipo Kyoyaki; as de renome, contudo, são aquelas executadas pelo ceramista Mokubei.

Quando se versa a respeito de cerâmica, deve-se falar sobre os utensílios para a Cerimônia do Chá. Dentre esses, a prioridade cabe às taças de chá. As peças do estilo coreano são especialmente apreciadas. As peças superiores são as do tipo Ido. Entre estas, as de Kizaemon, Kaga e Honnami são famosas. Mesmo hoje, seu preço alcança a cifra de várias centenas de ienes, o que é assustador. A seguir, ainda como peças de origem coreana, temos as do tipo Totoya, Kakinoheta, Kobiki, Soba e outras. Peças genuinamente japonesas são as do estilo Seto antigo, Shino, Karatsu, Tyojiro, Nonko, Koetsu, Ninsei, Oribe, Hagi, Shigaraki e Iga. No que toca às peças do tipo Tyojiro, deve-se dizer que este foi o criador da cerâmica Raku e o artesão famoso a quem Rikyu devotou enorme deferência. Seus herdeiros, já na décima terceira geração, continuam a produzir cerâmica.

Quero, agora, discorrer brevemente sobre a atualidade. Do intervalo que se estende da era Meiji até os dias de hoje, parece não haver ninguém digno de menção especial. Poderíamos citar, como artesãos afamados, Kozan Miyakawa, Rokubee Shimizu, Hazan Itaya e Kenkichi Tomimoto. Quanto à porcelana chinesa, tem-se, primeiramente, a de cor verde-resedá, a qual se classifica em três tipos: Kinuta, Tenryuji e Shichikan. Existem, outrossim, as porcelanas Kochi, Banreki vermelha, Gosu, etc. Da cerâmica coreana, citaremos a Korai branca.

5 - A Caligrafia

Assim como gosto de pintura, gosto de caligrafia também. Como sabem os senhores, diariamente faço algumas centenas de peças caligráficas. Em termos de volume, sou eu aquele que mais produz desde a Antiguidade, no Japão. Escrevo, por hora, quinhentas peças do ideograma Hikari (Luz), destinadas à confecção de protetores. Escrevo, ainda, em trinta minutos, no mínimo cem peças com dois ou quatro ideogramas para quadros ou rolos. Como sou demasiadamente rápido, torna-se preciso que três homens me coadjuvem. Mesmo assim, eles não conseguem acompanhar-me. É um serviço que corre como em linha de montagem.

Há tempos, solicitei a um professor de caligrafia os seus préstimos. O motivo é que eu sentia certa dificuldade com relação à escrita cursiva, tendo a pretensão de saber mais a seu respeito. Ao explicar meu objetivo ao professor, ele respondeu-me o seguinte: "Desaconselho o senhor a fazer tal trabalho. A caligrafia aprendida enquadra-se em determinados moldes, sendo despojada de personalidade. Os caracteres assim escritos não têm vida. Sua forma, somente, é bela, mas nela não existe conteúdo. Hoje, eu próprio luto desesperadamente para romper com essa forma. Por isso considero que alguém como o senhor deva manifestar, de forma liberta, a sua personalidade. Na escrita cursiva, é de ínfima importância se um traço está faltando ou sobrando." Convencido, desisti do aprendizado.

É fato aceito que os antigos detêm superioridade tanto na pintura quanto no artesanato artístico. O mesmo acontece na caligrafia. Toda vez que vejo peças caligráficas antigas, eu me emociono. Gosto sobretudo dos trabalhos escritos em kana: a habilidade neles presente jamais poderá ser imitada pelo homem contemporâneo. Verdade é que tal notoridade provém, entre outras razões, do fato de as pessoas das épocas idas terem vivido folgadamente a se comprazer com a composição e a escrita de poemas, livres das agruras do cotidiano e das preocupações sociais. Como calígrafo moderno, cujas obras em kana não ficam a dever às dos antigos, poder-se-ia citar, talvez, apenas Saishu Onoe. Dentre os antigos, eu gosto, primeiramente, de Michikaze, Tsurayuki, Sadaie, Saigyo e Koetsu. As obras deste último, sobretudo, deixam-me com água na boca. Entre os poetas do gênero haikai, a letra de Basho possui características apreciáveis, e sua pintura, além de tudo, comparada com a de pintores profissionais, nada fica a dever. Pode-se deduzir, por este fato, que aquele que prima em certo ramo das artes atinge um nível elevado também nas demais áreas.

No que toca à escrita de caracteres chineses, nem é preciso mencionar Wang Hsi Chih ou Kukai. Como calígrafos da modernidade, San-yo, Kaioku, Takamori e Tesshu são consideráveis. Diga o que se disser, no caso dos ideogramas chineses, a personalidade fala mais alto que a técnica. Assim, a caligrafia dos grandes homens inspira respeito, ainda que a forma seja tosca. A explicação espiritual para o fato seria a seguinte: na caligrafia, a personalidade do seu autor encontra-se impressa. Assim, pela constante contemplação de uma peça caligráfica, recebe-se a influência da personalidade de quem a executou — neste ponto reside a nobreza da caligrafia. Portanto, uma peça da referida arte não possui valor caso não tenha sido executada por um grande homem, alguém dono de um grande caráter. Eis o motivo de ser aconselhável às gestantes realizarem a educação fetal por meio da contemplação de obras de caligrafia de grandes homens. Digo, a meu respeito, que a caligrafia assume um papel de suma importância na minha técnica de salvação, porque ela desempenha um grande feito. Todavia, por esta explicação ser por demais mística, tratarei dela em outra obra. Limito-me, agora, somente a comentar acerca da arte caligráfica.

Opiniões Pessoais, 30 de agosto de 1949

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