OGATA KORIN

Desde a minha juventude, sempre gostei demais de Pintura. E, indiscutivelmente, o meu pintor preferido é, independente de época, aquele famoso Korin. Dentre os artistas da escola Korin, tanto Koetsu, como Sotatsu, Koho e Kenzan têm, cada um deles, o seu sabor; todavia, Korin distingue-se, decididamente, por sua superioridade. Sua pintura, sendo concisa, logra captar a imagem real do objeto, fato que a torna ímpar. Desconsiderando completamente a forma das coisas, ele a expressa com fidelidade. Isso é idêntico à energia do poema japonês de trinta e uma sílabas que pode comover o homem, quando este não se convenceria ainda que com o emprego de milhões de palavras. O que mais me assombra é que até então a pintura nipônica esteve presa às formas legadas da China, e Korin ousadamente rompeu com essa tradição. Ou seja, ele acabou com o método da utilização da linha, substituindo por outro que prescinde dela, e renasceu para um estilo próximo do desenho esquemático. Resumindo, foi a sua ousadia em criar um método revolucionário de desenho, em oposição ao método tradicional que estava preso a determinados cânones.

Hoje, passados duzentos e algumas dezenas de anos depois do passamento de Korin, sua façanha provocou uma revolução nos círculos pictóricos da Era Meiji. Acerca disso, tenho o seguinte episódio a relatar. Trinta anos atrás, o mestre Tenshin Okakura, fazendo-se acompanhar de quatro pintores — Taikan, Shunso, Kanzan e Buzan — retirou-se para Izura, no antigo feudo de Hitachi. Naquela época, em virtude de certa circunstância, consegui entrevistar-me com o mestre Tenshin. Ele revelou-me, entre outras coisas, os seus futuros projetos com relação à Pintura japonesa. Tal contato foi-me por demais proveitoso e, na oportunidade, também tomei conhecimento do caráter invulgar do mestre. Naquele dia, varei a noite a confabular com os dois pintores Kanzan Shimomura e Buzan Kimura. O mestre Kanzan confessou-me então: “A intenção do mestre Tenshin, ao fundar o Instituto de Artes, foi de reabilitar Korin na atualidade. Por isso, nós não fazemos uso da linha propositadamente. Hoje, a sociedade faz pouco caso de nossa pintura, apelidando-nos de escola da opacidade. Há de vir, porém, um dia em que haveremos de ser reconhecidos, infalivelmente”. Justamente como ele afirmou e é do conhecimento geral, pouco tempo depois, o estilo do grupo do Instituto de Belas-Artes passou a dominar o mundo japonês da pintura, fazendo a revolução desta. O mestre Kanzan tecera, ainda, algumas considerações, nesse sentido. A pintura, no Ocidente, em virtude do extremo a que atingira a escola realista, tendo passado a competir com a fotografia, ao enveredar pelas sendas do pormenor, chegara a tal ponto que exaurira, totalmente, as suas possibilidades. Quando todos os esforços visavam a desvendar um caminho que levasse a uma grande mudança, alguém, na França, descobriu Korin. Pode-se imaginar com facilidade a surpresa e a admiração experimentadas perante o rumo tomado pela pintura de Korin, completamente inverso ao do realismo elaborado. Como era de se esperar, nasceu o desenho do estilo art nouveau, apareceu o movimento pré-impressionista, e, finalmente, nasceram os grandes gênios da escola pós-impressionista, como Van Gogh, Gauguin, Cèzanne e outros. E não foi somente tal o acontecido: a descoberta provocou uma revolução em todos os ramos das Belas-Artes e do Artesanato, atingindo até a Arquitetura. Como todos sabem, os estilos grego e romano vigentes, até então, passaram por uma imensa mudança graças ao secionismo; o estilo renascentista recolheu-se e daí brotou o estilo arquitetônico moderno. É inegável que o estilo que atualmente prevalece no mundo inteiro, criado pelo francês Le Corbusier, de extrema simplicidade, recebeu no fundo a influência de Korin.

Creio que não é exagero afirmar que o japonês Korin, que, alguns séculos após sua morte, subitamente agitou o mundo inteiro, ou melhor, revolucionou um campo da civilização, é o maior orgulho deste país. Até hoje, não houve um japonês cuja obra lograsse revolucionar um setor mundial. Somos obrigados a afirmar que Korin foi o único.

Ensaios, 30 de agosto de 1949

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